Entrelinhas (2005)

(A Chico Buarque de Holanda)
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Vai! Você pode ir,
E não esqueça dos detalhes,
Por favor:

Leve seus brincos, traga o colírio.
A leitura deixou meus olhos cansados.

Deixe tocando Buarque de Holanda,
Assim a lua, quem sabe, entra pela varanda.

Ponha a bandeira a meio mastro,
E por favor, não dê mais um passo.

Tranque as janelas e vá embora.
(Quero que você fique fora)

Separe a distância
Entre o chão e o teto.
Se passar pela estante
Amarre o dragão lá por perto.

Deixe os coringas
Entre copas e espadas,
Tome seu drinque,
Desvie as flechadas.

Compre cigarros
De filtro amarelo,
Plante um jasmim
E um cravo vermelho.

Tome meu vinho e quebre a taça,
Quero beber mesmo é cachaça.
Não esqueça de regar a folhagem.
Peça sedas, e boa viagem...


Ode à Loucura (2005)

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Na falsa métrica dos dias
Perder-se no tempo verbal.
Os dias em que sorririas,
Transformar em carnaval.


Jônatas Luis Maria

O Ciclo da Criação

(2005)
À Mary Shelley
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Crio-te, Criatura,
Feito do criador.

Alimento-te, Criatura,
D'um sentimento de pavor.

Ensino-te, Criatura,
Arte e esplendor.

Assisto-te, Criatura,
Destilando todo horror.

Destrua-me, Criatura,
Nada mais tenho em teu favor.

Cria Criatura. Cultiva com calor
E perpetua o ciclo desse amor.

Jônatas Luis Maria

Humano demasiado humano!

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Partida em cacos a minha visão
Nossa canção já começa pelo fim.
Tudo que se vê é a morte
E a morte mora ainda na razão.

Dia-a-dia em flor, em poética concretista.
Dia minimalista, dia morto, dia sem sol.
Nunca houve a luz, senão uma lâmpada.
Cotidiano de cocaína e capital.

Vida de horrores, de horrores e nada mais.
Vida de silício, de plástico e mau humor.
Vida vaginal de proveta, vida de gaveta.
Vida vida vida: A grande mentira cósmica!

Vamos viver e completar este ciclo natimorto.
Somos tetraplégicos e recheados de tumores.
Oh filosofia, que enfie o Sartre no Kant!
Somos a internet, e as ninfetinhas pós-modernas.

Somos a Intel e há caca-cola nos curtos-circuitos.
Somos à prova d’água, e no entanto, afogados no parto.
Interatividade mórbida no ventre da geração 2.0.
Ah texto irrelevante: Vá trepar com Fernando Pessoa.

A vida é uma puta, cheia de máculas, e hoje,
Ganha esta puta a sua prótese tão mecânica.
E se conecta na inter-orgia, uns nos rabos dos outros.
Sejamos a molécula seminal enfiando a vida no PC.

Sejamos o parto da criatura mais vil!
O pedaço de Ser mais limpo que existe.
Sejamos uma adolescente gritando Google;
E Nietzsche chuparia a irmã, sem remorsos virtuais.

Jônatas Luis Maria