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Pretendo ser conivente
com minhas garrafas de vinho,
com as xícaras de café,
com a eloquência fingida
dos livros que jamais lerei.

Afinal, quem mais há de compreender
essa tamanha obsolescência do mundo,
senão as garrafas de vinho,
as xícaras de café, e os livros que não li?

Quem haveria de sustentar-me,
senão as bebedeiras?
Onde poderia eu desfalecer,
senão no sofá de casa
que foi sempre quem me acolheu
sem fazer perguntas?

Quais diálogos poderia querer,
senão com as plantas domésticas?
E quais discursos proferiria, senão aqueles
para folhagens e pássaros, atentos e quietos
pelas praças afora?

A quem poderia amar,
senão as refeições solitárias,
os computadores móveis
e os elevadores?

Quero estar atento
quando não tocar nenhuma música,
quero estar sóbrio, ao ouvir
meu corpo que palpita sem porquês.

E ao olhar em volta de mim,
perceber que todas as construções
que o eu passado arquitetara
são ruinas de todas as coisas que esqueci.

E finalmente, entre as cadeiras,
sobre os tapetes, em meio à programas de TV,
atônito mas precavido,
vislumbrarei essas irrelevâncias e saberei enfim,
que todas as realizações foram em vão.

Jônatas Luis Maria